A Dengue é uma doença que vem assolando a população brasileira há mais de 40 anos. Todos os anos vemos o aumento dos casos, principalmente nos períodos de maior calor e chuvas. O controle da transmissão pelos mosquitos já não é mais possível nos grandes centros urbanos. Novos recursos, como a implantação de bactérias eliminadoras do vírus nos mosquitos (método Wolbachia) e mosquitos geneticamente modificados podem ser promissores, mas ainda não temos como saber o resultado e, provavelmente, serão medidas que só funcionarão a longo prazo. Além disso, não podemos esquecer que os mesmos mosquitos que transmitem a Dengue, também podem transmitir outras doenças com aspectos clínicos semelhantes, como Zika e Chikungunya.
O ano ainda está começando e já temos uma quantidade de casos consideravelmente superior às ocorridas no mesmo período dos anos anteriores, trazendo também o aumento da quantidade de casos mais graves e até fatais. Uma das medidas que poderiam ter maior impacto seria a vacinação em massa; entretanto, até o momento, não se tem a disponibilidade da quantidade necessária de vacinas para tal.
Na grande maioria dos casos, a Dengue é uma doença de evolução benigna; entretanto, alguns casos podem se tornar mais graves; o que é mais frequente em quem já teve a doença anteriormente, causada por um dos quatro tipos diferentes do que causou a primeira infecção; daí a importância da identificação e monitoramento dos tipos circulantes. Isso ocorre porque a infecção pelo vírus da Dengue gera proteção imunológica para o tipo específico do vírus que causou a infecção; entretanto, a imunidade não é completa para a infecção por outros tipos, o que acaba causando sintomas mais severos, com extravasamento de líquidos do interior das células, tecidos e cavidades, podendo levar a casos desidratação extrema e hemorragia generalizada. Nesses casos, a piora do quadro ocorre entre o terceiro e o sétimo dia do início da doença, justamente quando há diminuição da febre e de outros sintomas; daí a importância da confirmação diagnóstica através de métodos laboratoriais, permitindo acompanhamento da evolução dos casos com maior segurança.
A nova vacina para Dengue, é bastante promissora para a diminuição de casos. É uma vacina feita de vírus vivo atenuado (que não causa doença), capaz de proteger contra os quatro tipos do vírus, podendo ser aplicada tanto em quem não teve, como em quem já teve a doença. A vacina foi desenvolvida a partir do tipo 2 e, por este motivo, tem maior efetividade contra este tipo, como também para o tipo 1, justamente os de maior circulação nos últimos anos. No geral, a vacina protege em cerca de 80% para casos de hospitalizações e cerca de 90% para o desenvolvimento de doença grave, justamente o mais importante. Os estudos mostraram que a vacina é segura, sem ocorrência de reações graves. As contraindicações seriam para mulheres grávidas, mulheres que estão amamentando, imunodeficientes, imunossuprimidos e quem sabidamente tem algum tipo de alergia aos componentes da vacina. É importante, lembrar que, como a grande maioria dos casos graves ocorre em pessoas que já tiveram a doença, a vacinação neste grupo se torna importante.
A vacina foi testada em diversos locais do mundo e, atualmente, se encontra disponível, além do Brasil, em países da União Europeia, Indonésia, Tailândia e Argentina. O Brasil é o primeiro país a distribuir de forma gratuita para a população. Infelizmente, o fabricante da vacina não tem ainda capacidade para fornecer quantidade suficiente de vacina para cobrir um grande país como o Brasil e, por este motivo, foram selecionados inicialmente, crianças e adolescentes entre 10 e 14 anos, baseado no fato em que é faixa que, depois dos idosos, vêm sendo registrada a maior quantidade de hospitalizações. A vacina também se encontra disponível na rede privada, sendo recomendada para quem tiver oportunidade.
O diagnóstico da Dengue é baseado em três tipos de teste, que têm performance e indicações diferentes conforme o período em que a doença se encontra e, se for infecção primária ou reinfecção.
O Teste é baseado na detecção de material genético viral circulante. É o primeiro marcador a poder ser detectado e o que apresenta maior grau de sensibilidade e especificidade (Sens: 85% a 90%, Espc: 100%). Outra vantagem do teste por RT-PCR é a possibilidade de distinção do tipo viral (DENV-1, DENV-2, DENV-3, DENV-4)). Nos casos de infeções primárias, o período de positividade vai desde dois dias antes do aparecimento de sintomas até aproximadamente o décimo dia de doença (-2 ao 10). Já em infecções secundárias, o período de detecção pode ser um pouco mais curto, até aproximadamente o sexto dia de doença (-2 ao 6). O período de maior concentração de RNA, onde o teste apresenta maior sensibilidade, é do primeiro ao quinto dia na infecção primária (1 ao 5) e do primeiro ao terceiro dia na secundária (1 ao 3).
NS1 é uma proteína proveniente do metabolismo viral, portanto presente em infecções ativas. O teste apresenta sensibilidade de 70% a 80% e especificidade de 99% a 100%. O período de detecção no sangue varia conforme o tipo de infecção, indo, nas infecções primárias, do dia anterior ao aparecimento de sintomas ao décimo dia de doença (-1 ao 10). Nas infecções secundárias, o período de detecção pode ser um pouco menor, indo do dia anterior ao aparecimento de sintomas até o sexto dia de doença (-1 ao 6). Os períodos de maior sensibilidade do teste vão do segundo dia após o aparecimento dos sintomas até o sexto dia de doença (1 ao 6) nas infecções primárias e do segundo ao terceiro nas infecções secundárias (2 a 3).
A detecção de anticorpos circulantes tem maior relevância nos casos em que não foi possível a realização de testes de antígeno ou RT- PCR no início da doença, mas também pode ter importância na distinção entre infecção primária e secundária, principalmente porque no último, a formação de IgG pode ser exacerbada a partir do terceiro dia de doença, mesmo sem a presença de IgM. Os períodos de detecção variam para IgM do terceiro ao décimo quarto (3 a 14), tendo o seu maior período sensibilidade do quinto ao décimo dia (5 ao 10), tanto para infecções primárias como secundárias. Para IgG, o período de detecção e maior sensibilidade pode variar conformo o tipo de infecção, indo de a partir do sétimo dia nas infeções primárias (> 7) e a partir do quarto dia (> 4) nas secundárias. Os períodos de maior sensibilidade variam do quinto ao décimo dia (5 – 10) para IgM tanto para infecções primárias como secundárias, e do décimo dia (> 10) para infecções primárias e a partir do quinto dia (> 5) para secundárias no caso de IgG. O grau de sensibilidade e especificidade para IgM é de 75% a 100% e 90% a 96%, respectivamente. Para IgG a sensibilidade varia de 85% a 95%, com especificidade superior a 90%.
Quadro 1. Testes disponíveis para o diagnóstico de Dengue
O painel ZDC multiplex, que detecta RNA circulante para Dengue, Zika e Chikungunya tem sua maior utilidade nos casos em que haja suspeitas por viroses com sintomatologia semelhante. O teste mantém sensibilidade e especificidade elevadas para todos os vírus detectáveis e também discrimina o tipo viral de Dengue (DENV-1, DENV-2, DENV-3 e DENV-4).
1º ao 5º dia de doença: NS1 ou RT-PCR (reservar PCR para casos de NS1 negativos).
Do 5º dia em diante: acrescentar IgG e IgM.
Em casos de suspeita de outras infecções: PCR Multiplex ZDC
Lembrar que o melhor teste em casos de dúvidas ou com outros testes negativos, permanecendo a suspeita clínica, é o RT-PCR, que pode ser aplicado até o 10º dia de doença, nos casos de infecção primária e até 6º em infecções secundárias.