Abordagens diagnósticas para sensibilidade alimentar


24.05.23

A prevalência de reações alérgicas alimentares é alta, chegando a 10% da população mundial, e vêm aumentando nas últimas 2 a 3 décadas. Essas reações parecem afetar desproporcionalmente pessoas em regiões industrializadas/ocidentalizadas e são mais comuns em crianças em comparação com os adultos. 

 

O que são reações alérgicas alimentares?

Segundo a Sociedade Brasileira de Alergia e Imunologia (ASBAI), a alergia alimentar é uma resposta exagerada do organismo a determinadas proteínas presentes nos alimentos. Na alergia alimentar ocorrem reações alimentares mediadas pelo sistema imune, levando à produção de imunoglobulinas do tipo IgE, e produzem reações clínicas exuberantes e bem definidas momentos após a ingestão do alimento. A pesquisa de imunoglobulina IgE específica, nestes casos, se positiva, determina a alergia a determinado alimento.

Já a sensibilidade alimentar é uma resposta do organismo também mediada pelo sistema imune, que leva a produção de imunoglobulinas do tipo IgG e provoca reação retardada, algumas horas ou dias após a ingestão do alimento. As reações não são tão fortes. A pesquisa de IgG específica para o alimento, quando positiva, determina a fonte de sensibilidade.

 

Fatores de risco que podem contribuir para a sensibilidade alimentar

Como todas as doenças crônicas, a expressão da alergia e sensibilidade alimentares é influenciada pela genética, meio ambiente e interações entre o genoma-ambiente, incluindo efeitos epigenéticos.

Inúmeros fatores de risco foram identificados ou propostos para contribuir para a alergia alimentar ou sensibilização, incluindo riscos imutáveis, como sexo (sexo masculino em crianças), raça/etnia (maior entre os asiáticos e crianças negras em comparação com crianças brancas), genética (associações familiares, e genes específicos).

Os fatores de risco, também associados as reações alérgicas alimentares, incluem a influência do microbioma, insuficiência de vitamina D, gordura na dieta (consumo reduzido de ácidos graxos poli insaturados ômega-3), consumo reduzido de antioxidantes, aumento do uso de antiácidos, obesidade (estado inflamatório) e o tempo e a via de exposição aos alimentos.

 

Diagnóstico para as reações alérgicas alimentares

O diagnóstico das reações alérgicas alimentares depende da combinação de um conhecimento da fisiopatologia e epidemiologia com a história do paciente e o resultado dos testes laboratoriais.

O padrão-ouro para o diagnóstico da alergia alimentar mediada por imunoglobulina E (IgE) continua sendo o desafio alimentar oral, com testes de IgE sérica e testes cutâneos servindo como alternativas aceitáveis. 

No entanto, o aumento da prevalência de alergia alimentar (tanto diagnosticada pelo médico quanto pelo paciente suspeito) levou os pacientes a buscarem uma variedade de outros procedimentos diagnósticos alternativos para suspeita de sensibilidade alimentar.

 

Anticorpos IgG específicos de alérgenos

Os anticorpos IgG específicos para alérgenos, ou seja, substâncias de origem natural capazes de provocar uma hipersensibilidade em pessoas mais suscetíveis, desempenham um papel na tolerância clínica, ocorrendo naturalmente ou induzida por imunoterapia específica para alérgenos.

 

A produção de anticorpos IgG a partir de um amplo painel de alimentos comuns e  alérgenos inalantes

Publicado pela revista J Allergy Clinical Immunology, um estudo recente investigou a variabilidade geográfica da produção de IgE específica para alérgenos orais e anticorpos IgG contra uma grande variedade de alérgenos alimentares, usando soros obtidos de indivíduos recrutados em vários lugares da França em 2017.

Neste estudo, os autores demonstraram que para os alérgenos alimentares, respostas de produção de IgG foram mais frequentes, enquanto as respostas de IgE foram raras. Os resultados indicaram que o contato com o alérgeno pela via oral conseguia induzir respostas de IgG, enquanto o contato com alérgenos pela via respiratória parecia ser importante para a sensibilização de IgE.

As análises das respostas de IgG frente a um conjunto abrangente de doenças respiratórias e alérgenos alimentares sugerem que essa resposta está relacionada com a exposição através do trato respiratório, do trato gastrointestinal, e possivelmente através da pele.

 

Análises de IgG podem ser usadas como diagnóstico de doenças crônicas

Vários estudos também já demonstraram que a produção de IgG específica para alimentos também pode ser usada ​​para diagnosticar doenças crônicas mediadas por alimentos, por exemplo, síndrome do intestino irritável, fadiga crônica, enxaquecas, processos inflamatórios crônicos e doenças autoimunes e degenerativas, entre outras doenças.

Há também evidências clínicas de que a eliminação da dieta de alimentos identificados pela pesquisa de IgG laboratorial em pacientes portadores de síndrome do cólon irritável e complicações digestivas, contribui significativamente para melhorias na sintomatologia.

Para as outras “alergias alimentares” tardias ou queixas crônicas que podem estar relacionadas a alimentos, existem alguns estudos que sugerem que a modificação da dieta com base no teste de IgG leva à melhora dos sintomas; no entanto, estudos mais rigorosos são  necessários para apoiar seu uso.

Em suma, o teste de IgG específico para alimentos, pode aumentar a compreensão sobre quais intervenções devem ser feitas, e usado em conjunto com outros métodos, abre novos caminhos para o diagnóstico em pacientes hipersensíveis.  

A presença de IgG específica para alimentos não necessariamente indica processos de hipersensibilidades alérgicas, mas um tipo de sensibilização conhecida como intolerância alimentar. Portanto, o teste tem caráter dinâmico e pode ter variações no resultado conforme a dieta. O ideal é que seja utilizado como padrão de controle, quando ocorre remoção de determinado alimento que apresentou resultado elevado.

 

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Referências:

Siroux V, Lupinek C, Resch Y, Curin M, Just J, Keil T, Kiss R, Lødrup Carlsen K, Melén E, Nadif R, Pin I, Skrindo I, Vrtala S, Wickman M, Anto JM, Valenta R, Bousquet J. Specific IgE and IgG measured by the MeDALL allergen-chip depend on allergen and route of exposure: The EGEA study. J Allergy Clin Immunol. 2017 139(2):643-654.e6. doi: 10.1016/j.jaci.2016.05.023.

Kruszewski J, Raczka A, Klos M, et al. High serum levels of allergen specific IgG-4 (asIgG-4) for common food allergens in healthy blood donors. Arch Immunol Ther Exp 1994; 42:259–61.

Atkinson W., Sheldon T.A., Shaath N., Whorwell P.J. Food elimination based on IgG antibodies in irritable bowel syndrome: a randomised controlled trial. Gut 2004 53: 1459-1464

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