Métodos para detecção de variantes genéticas envolvidas na síndrome de Rett


20.04.23

A síndrome de Rett é uma doença genética rara que leva a deficiência intelectual grave e progressiva, afetando quase exclusivamente crianças do sexo feminino, com uma incidência de aproximadamente 1 em 15.000 nascidos vivos [1, 2].

A síndrome de Rett responde sozinha por 10% dos casos de deficiência intelectual profunda de origem genética em mulheres [3]. Inicialmente as crianças afetadas pela síndrome começam a vida, aparentemente, saudáveis.

No entanto, dos 6 aos 18 meses sofrem regressão dos marcos iniciais, com deterioração das habilidades motoras, contato visual, fala, controle motor e desenvolvimento de uma série de sintomas neurológicos, incluindo ansiedade, arritmias respiratórias e convulsões [2].

A síndrome de Rett era considerada uma patologia puramente do sistema nervoso, incluindo neurônios e astrócitos. Mas, nos últimos anos, descobriu-se que essa síndrome também é uma patologia neuro-metabólica que envolve anormalidades de substâncias como o colesterol [4, 5].

 

Mutações do gene MECP2 e a síndrome de Rett

Variantes patogênicas do gene MECP2 estão associadas a síndrome de Rett, com uma frequência de 1 em ~10.000–23.000 mulheres e rara em homens.

Estima-se que mais de 95% dos casos típicos de Rett são causados por uma variante MECP2 [6]. Desde que a ligação entre esse gene e a síndrome foi identificada, milhares de variantes de MECP2 foram relatadas em pacientes em todo o mundo.

Esse gene codifica uma proteína que é onipresente, mas expressa principalmente no sistema nervoso, a MECP2. Essa proteína possuí duas isoformas principais: MECP2-E1 e MECP2-E2, diferindo em alguns resíduos de aminoácidos amino (N)-terminais.

Pacientes com a Rett possuem variantes patogênicas heterozigóticas do gene MECP2, localizadas na posição Xq28 no braço longo do cromossomo X [7]. Essas variantes são de diferentes tipos: mutações “non-sense”, deleções e inserções. Associações genótipo-fenótipo podem prever a evolução dos sintomas dos pacientes. Algumas variantes, como A140V, R133C ou deleções do domínio carboxi (C)-terminal, são conhecidas por gerar um fenótipo moderado [8].

Ao contrário, outras variantes estão associadas a formas graves desta síndrome, como aquelas que afetam o sinal de localização nuclear da proteína MECP2 ou levam a proteínas truncadas por inserção de um códon de parada prematuro [9]. Além de mutações de perda de função levando a Rett, duplicação ou triplicação do locus MECP2 leva a deficiência intelectual grave, características autísticas e disfunção motora [10].

Desta maneira, a determinação do gene MECP2 deve ser ajustada, pois tanto sua ausência (encefalopatia grave em crianças do sexo masculino e Rett em mulheres) quanto sua super expressão (síndrome de duplicação de MECP2) levam a sérias consequências neurológicas [11].

 

Ligação ao DNA e funções repressivas MECP2

A MECP2 é uma das proteínas mais abundantemente e sua expressão é baixa durante os estágios iniciais do desenvolvimento, mas aumenta progressivamente de acordo com seu papel fundamental na diferenciação neuronal, maturação, refinamento do circuito e manutenção sináptica [12].

Sua distribuição já parece alta e uniforme durante os primeiros períodos pós-natais no cérebro. No adulto, os níveis atingem o pico nas regiões corticais, hipocampo, cerebelo e bulbo olfatório. Por outro lado, a expressão de MECP2 também é alta nos pulmões e baço, mas parece significativamente menor nos rins, coração, fígado, estômago e intestino [13].

O gene MECP2 é um repressor transcricional devido sua ligação ao DNA metilado e compactação da cromatina [14, 15]. Outras proteínas que interagem com MECP2, incluindo remodeladores de cromatina, metiltransferases de DNA/histona ou helicase/ATPases, contribuem para o silenciamento de genes mediado por MECP2. Além desses papéis de repressão/ativação, a função do MECP2 parece também se estender aos níveis pós-transcricionais [14, 15].

 

Estudo molecular da Sindrome de Rett (MECP2)

Variantes patogênicas em MECP2 podem ser evidenciadas em testes, os quais devem ser solicitados isoladamente ou em combinação com alguns outros genes.

Com o advento do sequenciamento clínico amplamente disponível em larga escala, e com o uso crescente de informações genéticas na medicina convencional, a interpretação precisa destas variantes tornou-se amplamente utilizada e de fácil acesso.

Em um esforço para definir um padrão profissional para a interpretação de variantes genéticas envolvidas na síndrome de Rett, o Colégio Americano de Genética Médica e Genômica e a Associação de Patologia Molecular estabeleceram as diretrizes para avaliação e interpretação de variantes envolvidas nesta síndrome.

Em um artigo publicado na revista Hum Mutat., os autores realizaram um estudo piloto para testar a clareza e a precisão do uso dos critérios de interpretação de variantes personalizadas [17].

Neste estudo, um total de 87 variantes foram selecionadas para os genes testados: MECP2, UBE3A, CDKL5, FOXG1, SLC9A6 e TCF4, observadas em indivíduos encaminhados para exames clínicos. As variantes também foram escolhidas para representar os diferentes tipos de alterações (missense, indels, sinônimos, truncadas, etc.) [17].

Como resultados, os autores observaram que os genes incluídos neste estudo tinham múltiplos padrões de herança (ou seja, ligado ao cromossomo X, recessivo/dominante, imprinted, etc.) e geralmente totalmente penetrantes. Além disso, essas variantes analisadas também podem ser úteis para o entendimento da penetrância de tais variantes e suas associações ao início precoce, fenótipos graves, ente outros.

Outros painéis também podem fornecer variantes ainda não abordadas, e essas alterações nesses genes poderão ser correlacionadas com seu significado clínico. Tais resultados podem ajudar os médicos e laboratórios clínicos a interpretar genes totalmente penetrantes e de início precoce na Rett e em outras desordens genéticas raras.

 

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Referências:

[1] Amir RE, Van den Veyver IB, Wan M, Tran CQ, Francke U and Zoghbi HY. Rett syndrome is caused by mutations in X-linked MECP2, encoding methyl-CpG-binding protein 2. Nature Genetics 1999; 23: 185– 188.

[2] Lyst MJ, Bird A. Rett syndrome: a complex disorder with simple roots. Nat Rev Genet 2015; 16: 261- 75.

[3] Ibrahim A, Papin C, Mohideen-Abdul K, Le Gras S, Stoll I, Bronner C, Dimitrov S, Klaholz BP, Hamiche A. MeCP2 is a microsatellite binding protein that protects CA repeats from nucleosome invasion. Science. 2021; 372:

[4] Kahanovitch U, Patterson KC, Hernandez R, Olsen ML. Glial Dysfunction in MeCP2 Deficiency Models: Implications for Rett Syndrome. Int J Mol Sci. 2019; 20: 3813.

[5] Buchovecky CM, Turley SD, Brown HM, Kyle SM, McDonald JG, Liu B, Pieper AA, Huang W, Katz DM, Russell DW, Shendure J, Justice MJ. A suppressor screen in Mecp2 mutant mice implicates cholesterol metabolism in Rett syndrome. Nat Genet. 2013; 45: 1013- 20.

[6] Chahrour M and Zoghbi HY. The story of Rett syndrome: from clinic to neurobiology. Neuron 2007; 56: 422– 437.

[7] D’Esposito M, Quaderi NA, Ciccodicola A, et al. Isolation, physical mapping, and northern analysis of the X-linked human gene encoding methyl CpG-binding protein, MECP2. Mammalian Genome 1996; 7: 533– 535.

[8] Leonard H, Colvin L, Christodoulou J, Schiavello T, Williamson S, Davis M, Ravine D, Fyfe S, de Klerk N, Matsuishi T, Kondo I, Clarke A, Hackwell S, Yamashita Y. Patients with the R133C mutation: is their phenotype different from patients with Rett syndrome with other mutations? J Med Genet. 2003; 40: e52.

[9] Cuddapah VA, Pillai RB, Shekar KV, Lane JB, Motil KJ, Skinner SA, Tarquinio DC, Glaze DG, McGwin G, Kaufmann WE, Percy AK, Neul JL, Olsen ML. Methyl-CpG-binding protein 2 (MECP2) mutation type is associated with disease severity in Rett syndrome. J Med Genet 2014; 51: 152- 8.

[10] Van Esch, H., Bauters, M., Ignatius, J., et al. Duplication of the MECP2 region is a frequent cause of severe mental retardation and progressive neurological symptoms in males. American Journal of Human Genetics 2005; 77: 442– 453.

[11] Sandweiss AJ, Brandt VL and Zoghbi HY. Advances in understanding of Rett syndrome and MECP2 duplication syndrome: prospects for future therapies. Lancet Neurology 2020; 19: 689– 698.

[12] Ip JPK, Mellios N, Sur M. Rett syndrome: insights into genetic, molecular and circuit mechanisms. Nat Rev Neurosci. 2018; 19: 368- 382.

[13] Shahbazian MD, Antalffy B, Armstrong DL, Zoghbi HY. Insight into Rett syndrome: MeCP2 levels display tissue- and cell-specific differences and correlate with neuronal maturation. Hum Mol Genet. 2002; 11: 115- 24.

[14] Schmidt A, Zhang H, Cardoso MC. MeCP2 and Chromatin Compartmentalization. Cells. 2020; 9: 878.

[15] Nan X, Ng HH, Johnson CA, Laherty CD, Turner BM, Eisenman RN, Bird A. Transcriptional repression by the methyl-CpG-binding protein MeCP2 involves a histone deacetylase complex. Nature 1998; 393: 386- 9.

[16] McKnight D, Bean L, Karbassi I, Beattie K, Bienvenu T, Bonin H, Fang P, Chrisodoulou J, Friez M, Helgeson M, Krishnaraj R, Meng L, Mighion L, Neul J, Percy A, Ramsden S, Zoghbi H, Das S. Recommendations by the ClinGen Rett/Angelman-like expert panel for gene-specific variant interpretation methods. Hum Mutat. 2022 Aug;43(8):1097-1113. doi: 10.1002/humu.24302. Epub 2021 Dec 2. PMID: 34837432; PMCID: PMC9135956.