Cintilografia com Pirofosfato-Tc99m na Amiloidose Cardíaca


18.04.24

O que é Amiloidose e quais seus tipos?

A amiloidose é causada pela deposição extracelular de fibrilas insolúveis de proteínas de baixo peso molecular. Até à data, são conhecidas pelo menos 30 proteínas diferentes, sendo as mais comuns as cadeias leves (amiloidose AL), a proteína amiloide tipo A sérica (amiloidose AA) e a transtirretina (ATTR). Apesar da grande heterogeneidade na estrutura e função, estas proteínas depositam‐se nos vários órgãos, de forma localizada ou sistémica, podendo causar disfunção multiorgânica. Um dos principais órgãos acometidos é o coração.

A amiloidose tipo AL é caracterizada pelo aumento de cadeias leves livres no soro (FLC) - kappa (κ) - faixa normal de 0,33 a 1,94 mg/dL ou lambda (λ) - faixa normal de 0,57 a 2,63 mg/dL. O aumento da razão k/λ (valor normal de 0,26 a 1,65 em pacientes com função renal normal e 0,31 a 3,7 em portadores de insuficiência renal) é sugestivo de expansão clonal anormal. Trata-se de uma doença sistêmica, cuja prevalência de envolvimento cardíaco é de aproximadamente 50%. O seu tratamento é baseado em quimioterápicos que tenham como alvo a célula plasmática.

A TTR é uma proteína plasmática tetramérica, sintetizada principalmente no fígado que tende a dissociar-se em dímeros e monômeros, desintegrando-se em fibrilas. Mutações patogênicas ou idade avançada podem levar às duas formas clínicas: a mutante (ATTRm), também chamada de hereditária ou familar, e o tipo selvagem (ATTRs),
antigamente chamada de senil. O acometimento cardíaco pode acontecer de forma isolada ou em associação com sintomas neurológicos (polineuropatia amiloidótica familiar – PAF). Até há pouco tempo, a única forma de tratamento da ATTR era o transplante coração-fígado, procedimento de elevada morbimortalidade. Nos últimos
anos surgiram agentes modificadores da doença que têm um potencial de anunciar uma nova era para o tratamento da amiloidose cardíaca.

Qual a importância da Cintilografia com Pirofosfato-Tc99m na Amiloidose Cardíaca?

O diagnóstico de amiloidose e sua diferenciação entre os tipos AL e TTR são de suma importância para definições de prognóstico, terapia e aconselhamento genético.

Apesar da biópsia endomiocárdica ainda ser citada como padrão-ouro para o diagnóstico de amiloidose cardíaca, a investigação tornou-se bem mais acessível recentemente, devido à incorporação da cintilografia com radiotraçadores ósseos, como por exemplo, o pirofosfato. Diversos estudos demonstraram a capacidade da cintilografia com pirofosfato marcado com Tecnécio-99m em discriminar o subtipo de amilóide, diferenciando o tipo AL do ATTR, com alta sensibilidade e especificidade
diagnóstica. De maneira geral, esses traçadores apresentam captação cardíaca mais intensa na ATTR. O mecanismo fisiopatológico relacionado à afinidade destes radiotraçadores ósseos às fibrilas de amilóide ainda não é totalmente conhecido, mas possivelmente deve-se ao maior conteúdo de cálcio presente na ATTR. Assim a cintilografia com pirofosfato é considerada uma ferramenta crucial na pesquisa e diferenciação da amiloidose cardíaca.

Avaliação da extensão e técnica para diferenciação do subtipo da doença:

O exame pode fornecer informações detalhadas sobre a extensão do depósito de tecido amiloide no coração, incluindo se há envolvimento de ambos os ventrículos.

A técnica do exame é relativamente simples, sem nenhum tipo de preparo específico, de baixo custo, sem contra-indicações ou efeitos colaterais. O marcador ósseo é injetado em veia periférica. Imagens planares e tomográficas (SPECT) do tórax são adquiridas com intervalo de 1 e 3 horas após.

Na imagem planar anterior desenham-se duas áreas de interesse, sendo uma delas sobre a área cardíaca e o outra, espelhada, localizada no hemitórax contralateral, no campo pulmonar para análise semiquantitativa. As contagens (ou seja, quantidade de material radioativo concentrado nestas áreas) são medidas nas duas áreas, e uma relação entre a captação no hemitórax esquerdo e no hemitórax direito é calculada (Figura 1).

Relações maiores que 1,5 possuem sensibilidade de 84,6% e especificidade de 94,5% para o diagnóstico de AC na forma TTR. As imagens SPECT (Figura 2) são úteis para melhor localizar quais cavidades cardíacas estão infiltradas por proteína amiloide, especialmente quando associadas às imagens da tomografia computadorizada SPECT/TC (Figura 3).

A intensidade de concentração do pirofosfato-Tc99m na área cardíaca também correlaciona-se com o subtipo de amiloide. Na avaliação visual aplica-se a escala de Perugini para avaliação qualitativa, onde o grau de concentração é comparado à captação óssea do gradil costal, sendo grau 3 (Figura 1) de maior intensidade que os arcos costais; grau 2, de igual à intensidade de concentração dos arcos; grau 1, com concentração inferior à dos arcos; e grau zero, sem concentração cardíaca significativa do traçador.

Concentrações intensas estão fortemente associadas ao tipo ATTR, de tal forma que alguns autores sugerem o descarte da biópsia cardíaca nestas situações, uma vez que foram encontrados valores de sensibilidade acima de 90% e especificidade de 97% para o diagnóstico na forma ATTR. Concentrações menos intensas (grau 1) ou ausentes sugerem a forma AL quando há suspeita clínica. Em ambas as situações é recomendada a complementação com a pesquisa laboratorial detalhada a seguir, para descartar e/ou confirmar a presença dos anticorpos de cadeia leve relacionados à AC forma AL.

Vale ressaltar que após a cintigrafia com pirofosfato-Tc99m detectar o acúmulo anômalo de transtirretina no miocárdio, a investigação deve sempre ser complementada com o estudo genético da transtirretina para distinguir a amiloidose ATTR (transtirretina mutante) da amiloidose senil (transtirretina wildtype.).

 

Figura 1. Cintilografia cardíaca com pirofosfato-Tc99m - imagem planar anterior demonstrando captação anômala intensa do radiotraçador na topografia cardíaca, com escore visual grau 3 de Perugini e relação coraçao/contralateral > 1,5, característico para o diagnóstico de amiloidose cardíaca subtipo TTR.

 

Figura 2. Cintilografia cardíaca com pirofosfato-Tc99m - imagem tomográfica SPECT com cortes do eixo curto demonstrando intensa captação anômala do radiotraçador na topografia dos ventrículos esquerdo e direito.

 

Figura 3. Cintilografia cardíaca com pirofosfato-Tc99m - imagens tomográficas SPECT/TC demonstrando intensa captação anômala do radiotraçador na topografia dos ventrículos esquerdo e direito.

 

 

Leitura sugerida

Atualização da Diretriz Brasileira de Cardiologia Nuclear – 2020 - DOI: https://doi.org/10.36660/abc.20200087

Posicionamento sobre Diagnóstico e Tratamento da Amiloidose Cardíaca – 2021 Bras. Cardiol. 2021; 117(3): 561-598

O que há de novo na amiloidose cardíaca? DOI: 10.5935/2318-8219.20180029

AMILOIDOSE CARDÍACA QUESTÕES PRÁTICAS DA ASNC

ASNC/AHA/ASE/EANM/HFSA/ISA/SCMR/SNMMI expert consensus recommendations for multimodality imaging in cardiac amyloidosis: Part 1 of 2-evidence base and standardized methods of imaging - DOI: 1007/s12350-019-01760-6

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